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18 de junho de 2020 por Alexandre Mendes

A lógica dos julgamentos práticos

A lógica dos julgamentos práticos
18 de junho de 2020 por Alexandre Mendes

Comentário do antropólogo Paul Rabinow sobre o filósofo John Dewey. Estrato do artigo: RABINOW, Paul. “Prosperity, Amelioration, Flourishing: From a Logic of Practical Judgment to Reconstruction” In: Law and Literature, Vol. 21, No. 3 (Fall 2009), pp. 301-320. Convidamos os leitores à leitura do artigo original e completo, disponível aqui.

(...) 

 Já em 1903, em seu artigo "A lógica dos julgamentos práticos", John Dewey, de forma determinada e abrangente, argumentou em defesa de uma abordagem sobre a lógica dos julgamentos práticos que não fizesse referência a um conjunto formal de procedimentos orientados à consistência e à integridade internas, ou, tampouco, às condições e restrições de um estado mental subjetivo. Em vez disso, ele defendeu que o julgamento prático é guiado por uma prática reflexiva e reiterativa de intervenção pragmática, modificação e nova intervenção. Sua batalha com os neokantianos, os idealistas, os formalistas e, acima de tudo (após o surgimento de sua Lógica, em 1938), com Bertrand Russell, forneceu o contexto e o estímulo para um ajuste cuidadoso de sua posição central durante o curso da primeira metade do século[i].

 Na lógica do julgamento prático, segundo Dewey, não está em questão a execução de uma operação matemática, mas a realização de uma ação orientada no interior de uma dada situação. Um julgamento prático (e suas proposições relacionadas), diz o autor, é "por si mesmo um elemento de finalização da situação, levando-a adiante à sua conclusão". Por conseguinte, um julgamento lógico não existe no domínio das abstrações, não é externo às ações, eventos e resultados derivados, mas é "um fator determinante no resultado" desses processos e práticas[ii]. 

 Assim, participar da lógica dos julgamentos práticos é participar da ação estratégica e experimental como o modo pelo qual o pensamento, a avaliação, o julgamento e o aprendizado são efetivamente realizados. O que está em jogo na lógica dos julgamentos práticos não é nem a definição de universais, nem a demonstração das categorias inerentes ao pensamento analítico, transcendental, ou algo semelhante. Considerado a partir deste modo pragmático e verificacionista, um julgamento lógico é, simultaneamente, uma avaliação de um fim almejado e uma pretensão quanto aos meios disponíveis para atingir esse objetivo. Disso resulta que, uma vez que os julgamentos práticos são ações, eles não podem ser avaliados, nem de forma abstrata, nem a priori. É somente quando são colocados em prática é que podem, de fato, ser avaliados. Portanto, julgamentos lógicos não são externos a um caso, mas são, simultaneamente, os meios e os fins para decidir sobre o valor de um julgamento proposicional. Dewey escreve: “A determinação de meios-fins (que constituem os termos e as relações da proposição prática) é hipotética até que o curso da ação indicado tenha sido tentado. O acontecimento ou o problema de tal ação constitui a verdade ou a falsidade do julgamento”.[iii] Mais tarde, em sua Lógica (1938), Dewey chamou esse modo de veridicção de “asserção garantida” [warranted assertion]. 

 Dewey insiste que os julgamentos práticos, tal como os valores, não são subjetivos, eles são, na verdade, pragmáticos. Além disso, não só os julgamentos práticos não são subjetivos, como eles “não dizem respeito ao valor dos objetos; mas ao curso de ação exigido para levar uma situação incompleta à sua realização”[iv]. Não sendo nem subjetivos, nem objetivos, os julgamentos práticos constituem modos engajados e experimentais de intervenção e avaliação de uma situação determinada. Dewey, é claro, não era um relativista. Esse termo, como Richard Rorty adorava nos lembrar, só se transforma numa questão, sobretudo, para os objetivistas. Dewey, Rorty e – pode surpreender alguns - Michel Foucault estavam preocupados, principalmente, com usos pragmáticos do pensamento, e não com os usos dialéticos ou analíticos. 

 Além disso, de forma coerente com o que já foi aqui exposto, tem-se que os critérios para avaliar os julgamentos práticos não são formais ou a priori. Eles são pragmáticos e conduzidos por objetivos. A lógica dos julgamentos práticos consiste na “busca por condições que tornarão, no futuro, casos semelhantes corrigíveis ​​e não despidos de esperança. Toda a espinhosa questão relacionada à autenticidade dos julgamentos práticos depende, exclusivamente, desse princípio. O problema continua em aberto. Mas tanto a decisão quanto a sua validade devem se basear em evidências empíricas”[v]. Os julgamentos lógicos ganham sentido, coerência e valor, apenas fazendo parte de uma investigação. E por investigação devemos considerar o sentido amplo, engajado e experimental que Dewey confere ao termo.

 Finalmente, não apenas a lógica dos julgamentos práticos é pragmática, como também os padrões ou medidas usados para avaliar essa lógica. "É frequentemente suposto", escreve Dewey, "que a avaliação deve ser um processo de aplicação de um valor fixo ou determinado sobre os vários bens concorrentes de uma situação; essa avaliação pressupõe um padrão anterior de valor e consiste em comparar os vários bens tendo esse padrão como valor supremo”[vi]. Dewey se insurge contra esse tipo de compreensão dos padrões, insistindo na ideia de que o padrão só surge no processo de determinação e correção, “não fora dele, e, portanto, não apto a ser empregado de uma forma já pronta para, então, solucionar o processo de avaliação”[vii]. Pois, se o padrão já foi estabelecido, então “tudo o que resta é sua aplicação mecânica ao caso em questão. Uma genuína incerteza moral é então impossível, se ela passa a existir, seria apenas o outro nome dado a uma suposta falta de vontade moral, derivada de um vício inerente em reconhecer e aplicar as regras já elaboradas e disponibilizadas, ou, então, a uma corrupção moral que enfraqueceu a capacidade de apreensão moral do homem”[viii]. Evidentemente, uma posição como essa, defendendo padrões morais fixos, externos e universalmente aplicáveis, ​​não é adequada às exigências pragmáticas inerentes às situações indeterminadas dentro das quais o pensamento ocorre. A resposta pragmática é que “o padrão é uma regra para conduzir a investigação até sua conclusão; é uma recomendação para que o exame dos fatores operativos seja completo, um aviso contra a falta de reconhecimento de qualquer um deles”[ix]. 

 Tudo isso é útil para o avanço do trabalho de análise e de diagnóstico. Como se sabe, porém, Dewey permaneceu em um alto nível de abstração em seu trabalho filosófico. É inteiramente possível que uma reflexão sobre as atuações mais práticas do filósofo -  na criação de escolas e outras iniciativas semelhantes - demonstre como essas discussões lógicas poderiam ser colocadas em operação. No caso de nosso trabalho, concernente às Práticas Humanas e à demanda de inventar e projetar equipamentos, a lógica de Dewey provou ser útil como um guia inicial para orientar a investigação. No entanto, sentimo-nos agora forçados a pesquisar em outro lugar, em grande parte em nossos próprios aportes, para poder realmente prosseguir com a nossa investigação.

 (...)

Tradução: Alexandre Mendes 
Notas: 

   [i] Tom Burke. Dewey’s New Logic: A Reply to Russell (Chicago: University of Chicago Press, 1994).     [ii] John Dewey, “The Logic of Practical Judgment”. In: Essays in Experimental Logic (1916) (Mineola, N.Y.: Dover Publications, 2004), p. 216 [tradução nossa - apud Rabinow]     [iii] Dewey, idem. p. 221. Sobre este ponto, ver: Burke, “Warranted Assertibility and Truth” [N.A].     [iv] Dewey, idem, p. 231.     [v] Id. p. 218.     [vi] Id. p. 236.     [vii] Id. p. 238.     [viii] Id. p. 239.     [ix] Id. p. 242. 
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